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Juízos apressados

Data: Sexta-feira, 23/05/2014 00:00
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Juízos apressados


            Há algum o tempo o compositor Chico Buarque de Holanda, de 69 anos, foi classificado por um cidadão despeitado como “velho gagá”. Um site publicou o depoimento de uma pessoa classificando a dupla de cantores sertanejos Chitãozinho e Xororó de dois “cantores bregas e velhos”. Outro escreveu no prestigiado site “Brasilpost” que o ator Tony Ramos, de 66 anos, era um “ator gagá em fim de carreira”. Afora essas, venho anotando juízos apressados sobre pessoas que tiveram relevante papel na sociedade brasileira ao longo de suas vidas.


            Do mesmo modo que esses, poderíamos então pôr na lista os cantores e compositores Milton Nascimento, Caetano Veloso, Djavan, Gilberto Gil, Fagner, Maria Bethania, Gal Costa, só pra citar meia dúzia. E atores e atrizes consagrados? Cientistas? Poetas? Escritores? Pais, mães?...a lista seria enorme de gente com os cabelos brancos e honrosamente “velhos”. Nenhum, necessariamente “gagá”.


            Meu pai, que morreu há três anos dizia uma frase memorável: “um homem tem que o ocupar o seu espaço no seu tempo”. Ora, gente que julga apressadamente pessoas da estatura de Chico Buarque, Chitãozinho e Xororó ou Tony Ramos, está sendo basicamente preconceituoso. Curioso, no exato momento em que Tony Ramos interpreta com extraordinária competência a versão humana do angustiado presidente Getúlio Vargas na minissérie “Getúlio”. A obra foca o ex-presidente humanizado e sofrido como político em fase terminal, pouco antes do suicídio, em 1954.


            Chico Buarque foi um dos maiores poetas opositores ao regime militar brasileiro, com suas poesias e músicas fortes. Isso, sem contar a sua veia poética de extrema qualidade, peças de teatro, e canções românticas. Naquele período ele sofreu desde o exílio forçado a todas as pressões políticas do regime militar que não aceitava quaisquer oposições.


            O que dizer de Chitãozinho e Xororó, dois modestos garotos que deram uma voz forte e inovadora à música de raiz no Brasil. Como eles, Sérgio Reis, também, todos com mais de 60 anos? Assisti no canal de TV paga ao primoroso show dos 40 anos de ambos, dirigido pelo maestro João Carlos Martins. Talvez se as músicas fossem cantadas em inglês seriam caricaturas, mas não seriam chamados de bregas nas suas homenagens às canções de raiz da caipirismo brasileiro, por gente desavisada.


            A baixa crescente na qualidade da educação brasileira somatizada na burrice da fala do ex-presidente Lula de que “nunca antes na história deste país...”, criou o sofisma de que a cultura anterior é brega e burra. Ao mesmo tempo, no mundo inteiro o riquíssimo turismo valoriza cada vez mais as memórias nacionais. Menos no Brasil, onde o “nunca antes...” parece ter se transformado num atestado de burrice para juízos apressados. Uma pena. Falta de educação!


Onofre Ribeiro é jornalista em Mato Grosso

[email protected]    www.onofreribeiro.com.br



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