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NOTÍCIA

JN no Ar registra caos na saúde pública em duas cidades de MT

Data: Sexta-feira, 21/10/2011 00:00
Fonte: JN no AR/ G1

O JN no Ar foi para Mato Grosso mostrar uma situação de caos na saúde pública em duas cidades.

As consequências dessa situação para os pacientes são terríveis. Na quinta-feira (20) à noite e nesta sexta (21) pela manhã, a equipe viu a boa vontade dos médicos, mas muito pouco além disso.

No pronto-socorro de Várzea Grande, há falta de investimentos e superlotação. Porque a história começa com o fechamento de outro pronto-socorro, o da capital do estado, Cuiabá, que fica perto dali.

Então há muita gente no mesmo lugar, recebendo atendimento muito precário: atendimento nos corredores, em qualquer lugar, pessoas com problemas simples, mas também gravíssimos, que precisam de cirurgia, e não têm.

Do Rio a Cuiabá são 1,7 mil quilômetros. Depois de duas horas e meia de voo, a equipe do JN no Ar pousou, no fim da noite, e foi direto para o pronto-socorro.

A equipe de reportagem chegou no momento em que a ambulância deixava mais um paciente na unidade de saúde, um homem que sofreu um acidente de carro. Mas como tantos outros, ele ia ter que ficar no corredor. Não havia espaço nem na sala de emergência.

“Aqui era para chegar emergência cirúrgica e emergência clínica. Deu o primeiro atendimento, define para onde vai: UTI ou enfermaria, mas aqui virou enfermaria, virou leito”, relata o médico Emanuel Almeida.

Em qualquer canto do pronto-socorro se improvisa um leito. Um rapaz com fratura no braço ficou no chão com a acompanhante a noite toda. Ele esperava uma vaga no centro cirúrgico, onde só uma das salas funciona. Os médicos têm que escolher quem vão socorrer.

“Se chegar um paciente em estado gravíssimo que precise de uma cirurgia, a gente tenta estabilizar ele ao máximo para suportar, esperar um pouquinho para operar em seguida. Mas operar imediatamente, neste momento, como está ocupada a sala de cirurgia, não tem como”, explica o médico.

Nem o básico tem. Jaqueline cortou a cabeça em um acidente de trânsito. Não havia material para dar pontos.

Nesta sexta-feira (21) de manhã, deu para ver melhor a extensão do problema. Praticamente todos os corredores do pronto-socorro estão lotados. Para onde se olha, tem paciente. A maioria das pessoas está internada em sentadas, nas macas e em pé. As condições são péssimas.

Carla só ficou sentada porque levou a cadeira de casa. “A gente se sente um lixo. Tanto dinheiro sendo roubado e o sistema de saúde essa calamidade”, ela lamenta.

Para encontrar um paciente no tumulto, as enfermeiras improvisam.

A situação piorou depois que a unidade passou a receber pacientes de Cuiabá. O pronto-socorro da capital fechou as portas na semana passada porque parte do teto desabou durante uma chuva.

Segundo o superintendente do pronto-socorro de Várzea Grande, Wagner Lopes, antes do acidente, o número de atendimentos já estava o dobro da capacidade. E agora virou o caos: são mais de 600 pessoas por dia.

“Nós estamos agora atulhados de pacientes, estamos com questão de medicamentos porque estamos gastando muito mais do que gastávamos antes, materiais. Então, realmente, estamos atendendo muito mal essas pessoas que sofrem, pessoas que não têm convênio, que merecem a nossa atenção”, explica Wagner Lopes.

De acordo com o médico, a prefeitura, responsável pela fundação que administra o pronto-socorro, não repassou verbas este ano. O prefeito Sebastião Gonçalves admite e diz que atualmente só tem condições de pagar os salários de médicos e enfermeiros.

“A prefeitura tem sérios problemas financeiros, portanto, o pronto-socorro gera hoje um déficit de 500 mil a 600 mil mensais”, avalia o prefeito.

Já o governo do estado, que transfere recursos para Cuiabá e Várzea Grande, quer ficar com a gestão das duas unidades de saúde.

“Daqui a pouco, eu vou ser obrigado a tomar uma medida mais drástica e fazer uma intervenção. Nós não queremos isso. Nós queremos fazer uma transição pacífica”, garante Pedro Henry, secretário estadual de Saúde.
No fim da manhã, a Justiça concedeu liminar a um pedido da defensoria pública para que outras unidades de saúde, nos dois municípios, também sejam obrigadas a atender casos de emergência, mesmo que não sejam conveniadas ao SUS.

O defensor Marcelo Leirião diz que no caso dos hospitais particulares, os custos terão que ser cobrados do governo estado: “Podem até alegar falta de estrutura para receber os pacientes, mas se ocorrer algum óbito, alguma coisa, vão incorrer o crime de omissão de socorro”, alerta.

Ver o pronto-socorro de Várzea Grande menos lotado devolve esperança a Dona Rosalina. Aos 80 anos, ela espera, há três meses dias, por uma cirurgia na perna. “O médico chega e só fala aguenta aí. Tenho que esperar passar a dor”, conta.

A reportagem foi feita com apoio da TV Centro-América, afiliada da Rede Globo de Mato Grosso.

Segundo informação da assessoria de imprensa do pronto-socorro de Cuiabá, a unidade deve reabrir neste sábado (22) e atender normalmente os pacientes, o que pode diminuir o sofrimento dos moradores da região.