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NOTÍCIA

Disputa entre cidades atrasa projeto da Vale para explorar potássio em SE

Planejado desde 2009, investimento ainda não saiu do papel. Japaratuba e Capela disputavam divisão do ICMS gerado pelo projeto.

Data: Domingo, 04/05/2014 00:00
Fonte: Fábio Amato Do G1, em Brasília
Arte potássio em Sergipe (Foto: Editoria de Arte/G1)


Uma disputa entre duas cidades vizinhas do interior de Sergipe por arrecadação de impostos levou à paralisação de um projeto bilionário da Vale que prevê a exploração, na região, de cloreto de potássio, usado na produção de fertilizantes.


Planejado desde 2009 e com investimentos estimados em R$ 4 bilhões, o projeto até hoje não saiu do papel. Ele prevê a exploração de uma mina de carnalita que fica a cerca de 50 quilômetros ao norte da capital, Aracaju. Da carnalita, se extrai o cloreto de potássio, matéria-prima cujo consumo ainda é altamente dependente de importação. A produção atual em território brasileiro se restringe a uma única mina, também em Sergipe, que abastece apenas 8% da demanda interna.


A quebra de braço entre as duas cidades começou após a Vale escolher a cidade de Japaratuba para instalar a sua unidade de extração e processamento da carnalita. A vizinha Capela, que detém em seu subsolo a maioria das jazidas, não aceitou a decisão e iniciou uma campanha para alterar o projeto e disputar a divisão da receita de tributos e royalties que poderá multiplicar os orçamentos das prefeituras.


Cinco anos depois de anunciado, o empreendimento deve finalmente ser retomado, após a aprovação de um projeto de lei que oficializa o acordo entre os municípios para a divisão do ICMS gerado pela atividade.


Em nota, a Vale informa que sua diretoria aprovou a “continuidade da manutenção das atividades vitais do Projeto Carnalita.” A empresa aponta, porém, que ainda aguarda a “conclusão dos processos de licenciamento e segurança jurídica, pelas instituições competentes.”


De acordo com o Ministério de Minas e Energia, no local há uma jazida com reservas de 4,70 bilhões de toneladas. A previsão da Vale é retirar 1,2 milhão de toneladas de cloreto de potássio ao ano, o dobro do que o país produz atualmente.


No projeto elaborado pela Vale, estão especificados 75 poços de exploração, sendo cerca de 80% deles localizados na área de Capela e os outros 20% em Japaratuba. Já a usina de beneficiamento ficará no limite entre os dois municípios, a maior parte em Japaratuba. Também serão construídos dois Centros de Distribuição, um em cada cidade.


Área onde a usina será construída ainda não tem sinal de início das obras (Foto: Marina Fontenele/G1)Área ondeo projeto será construído ainda não tem sinal de início das obras (Foto: Marina Fontenele/G1)

Japaratuba x Capela
A disputa entre as duas cidades começou após Capela, que detém ceca de 80% da jazida de potássio, iniciar uma campanha para alterar o projeto da Vale que escolheu a vizinha Japaratuba para instalar a sua unidade de extração e processamento da carnalita.


Em jogo estava uma arrecadação estimada entre R$ 80 milhões e R$ 100 milhões em Imposto sobre Circulação de Mercarias e Serviços (ICMS), além de um montante em royalties estimado em mais de R$ 20 milhões.


“Não entendemos por que a Vale tomou a decisão de levar a unidade para a cidade vizinha”, diz o prefeito de Capela, Ezequiel Ferreira Leite Neto. Ele nega que tenha “barrado” o investimento da empresa e alega que a mobilização por alterações no projeto evitou que a cidade perdesse seus recursos minerais sem receber nada por isso.


Intalação da usina de beneficiamento da carnalita deve ajudar no desenvolvimento do comércio em Japaratuba (Foto: Marina Fontenele/G1)Intalação da usina de beneficiamento da carnalita deve ajudar no desenvolvimento do comércio em Japaratuba (Foto: Marina Fontenele/G1)

 

No final de fevereiro, depois de meses de negociações – e após o presidente da Vale, Murilo Ferreira, ameaçar desistir da mina –, as duas cidades entraram em um acordo que, enfim, eliminava as barreiras para o início da exploração do minério.


O acordo prevê que Capela, onde está a maior parte da jazida, receberá também a maior fatia do ICMS: cerca de R$ 30 milhões ao ano, valor que equivale a sete vezes a sua atual receita com o imposto. Japaratuba, que se manterá como sede da planta de exploração da Vale, ficará com cerca de R$ 5 milhões ao ano de ICMS, o dobro de sua receita hoje. Parte do ICMS total recolhido vai para os cofres do estado e outra para outros municípios, somando assim os R$ 80 milhões.


“Nada pelo nada, preferimos adiar isso [extração da carnalita] até virem os impostos para aliviar o sofrimento das pessoas”, diz Neto. Segundo ele, os impostos gerados pela chegada da Vale vão ser investidos na melhoria do atendimento médico e do saneamento básico da cidade, além da redução do analfabetismo de sua população.


“Abrimos mão dos impostos, mas vamos ter emprego para dar às pessoas”, afirma o prefeito de Japaratuba, Hélio Sobral. “A gente não podia se dar ao luxo de perder um investimento bilionário como esse”, completa.


Para ele, o acordo para divisão do ICMS foi “bom para todo mundo” e acabou com o impasse que impedia a Vale de fazer os investimentos. Sobral diz esperar que o projeto traga mudanças e desenvolvimento à região.


“A chegada da Vale à nossa cidade vai fazer a situação mudar da água para o vinho. Principalmente para os jovens, que não tinham perspectiva de emprego em seu próprio município, mas agora vão ter”, declara o prefeito de Japaratuba.


Árvores garantem sombra e decoram praça em Capela  (Foto: Marina Fontenele/G1)
A praça central de Capela
(Foto: Marina Fontenele/G1)

Maior investimento feito em Sergipe
De acordo com o secretário de Fazenda do governo de Sergipe, Jefferson Passos, se confirmada, a instalação da planta de exploração de carnalita da Vale será o maior investimento privado já feito no estado.


“Esse projeto não tem importância só para Sergipe, tem para o Brasil. A agricultura é o motor da nossa economia, mas, hoje, nós produzimos menos de 10% do cloreto de potássio que precisamos. E a única mina que temos está próxima da exaustão”, diz Passos.


O secretário avalia que a mina terá de 25 anos a 29 anos de vida útil e que, nesse período, pode evitar o gasto de R$ 17 bilhões com a importação de cloreto de potássio. Além disso, deve gerar 4 mil empregos diretos, na fase de implantação do projeto. Depois disso, serão mil empregos diretos.


O Brasil é um dos maiores produtores agrícolas do mundo, mas importa 92% do potássio que consome nessa atividade. Só em 2012 foram gastos US$ 3,512 bilhões com a compra, no exterior, de 7,04 milhões de toneladas do produto.

Dependência externa de potássio
O Brasil é um dos maiores produtores agrícolas do mundo, mas importa 92% do potássio que consome nessa atividade - principalmente a produção de fertilizantes. De acordo com o Ministério de Minas e Energia, só em 2012 foram gastos US$ 3,512 bilhões com a compra, no exterior, de 7,04 milhões de toneladas do produto. Os maiores fornecedores foram o Canadá (31,18%), Bielorrússia (21,96%) e Alemanha (18,93%).


A exploração da mina de carnalita pela Vale teria, portanto, potencial para triplicar a produção nacional do potássio. A única mina do país de onde se extrai atualmente o insumo, que também fica em Sergipe e é explorada pela Vale, deve chegar ao fim da sua vida útil em 2017. Ela produz cerca de 600 mil toneladas ao ano.


Potencial brasileiro
De acordo com o Ministério de Minas e Energia, existem hoje 643 alvarás concedidos pelo Departamento Nacional de Produção Mineral (DNPM) para pesquisar o potencial e viabilidade econômica de minas para produção de minerais de potássio no país, sendo 56,6% no Amazonas, 21,2% em Sergipe e 11,2% no Pará. Somente depois dessa etapa é possível avaliar o potencial de produção de cada uma delas.


O ministério aponta que “existem no Brasil ambientes geológicos favoráveis (bacias sedimentares) para ocorrência de sais de potássio”, sendo que na região de Nova Olinda do Norte, no Amazonas, as reservas de silvinita somam mais de 1 bilhão de toneladas. “Entretanto, para que essas reservas entrem em produção deverão ser desenvolvidos estudos para superar problemas de viabilidade técnico-econômica e ambientais”, diz o ministério.