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NOTÍCIA

'Não sou monstro', diz acusado de matar ex e filho de 4 anos em Cuiabá

Pedreiro falou pela primeira vez em audiência sobre o crime, na capital. Ele disse que se arrepende de ter matado filho e alega tiro acidental.

Data: Terça-feira, 26/03/2013 00:00
Fonte: Dhiego Maia Do G1 MT

Homem que confessou ter matado a ex-mulher e o filho chorou ao lado de advogado. (Foto: Reprodução/TVCA)
Homem que confessou ter matado a ex-mulher e o filho.
(Foto: Reprodução/TVCA)

 

Pela primeira vez à Justiça, o acusado de matar a tiros a ex-namorada e o próprio filho, de quatro anos, confessou ter cometido o duplo assassinato em novembro do ano passado, em Cuiabá, e alegou não ser um monstro. “Matei por raiva”, disse o pedreiro Jeanderson Xavier Rangel, ao contar detalhes do crime durante audiência de instrução realizada na 2ª Vara de Família, no Fórum da capital, na noite desta segunda-feira (25). Preso quatro dias depois do duplo homicídio, Jeanderson vai enfrentar o Tribunal do Júri em data ainda não marcada pela Justiça.

 

O acusado se disse arrependido e afirmou em audiência que vai esperar o resultado do julgamento para tentar reconstruir a própria vida. “Não sou nenhum monstro. Não tive a intenção de cometer esse crime. Estou sem palavras depois de tudo isso. Eu sei que as marcas vão ficar para sempre. Só espero que Deus me perdoe por tudo. Que Deus conforte o coração da família dela. Depois do julgamento eu quero replanejar a minha vida, construir uma nova família”, disse.

 

Naquele 1º de novembro de 2012, data do crime, por volta das 8h30, Jeanderson afirmou que procurou a ex-namorada, Ariele Lopes da Silva, de 23 anos, na casa dela, após saber que o filho estava doente. “No dia do fato ela me ligou pedindo dinheiro para comprar remédio para o meu filho”, disse.

 

Armado com uma pistola 7 ponto 65 que adquiriu por R$ 950, segundo ele, para se proteger de supostas ameaças do pai de Ariele, um sargento da Polícia Militar, o rapaz e a ex-namorada passaram a brigar. “Ela se alterou muito, me agrediu. Quando ela percebeu que eu estava armado tentou tirar a arma de mim. Ela forçou o gatilho e o tiro acabou atingindo o meu filho que estava deitado em uma cama”, disse o acusado. O disparo acertou a cabeça do menino, que sofreu traumatismo craniano e morreu na hora. Devido à confusão, o acusado classifica como ‘acidental’ o disparo que matou o filho dele.

 

Tia mostra a fotografia de estudante assassinada em Cuiabá (Foto: Leandra Ribeiro/ G1)
Tia mostra a fotografia de estudante assassinada
em Cuiabá (Foto: Leandra Ribeiro/ G1)

 

Na sequência, o casal continuou a brigar. “Depois do barulho do disparo fui saindo da casa e ela continuou a me bater. Eu tentei pegar o celular para chamar a emergência para socorrer o meu filho, mas ela continuou a me bater, segurou a minha camisa e eu não consegui escapar. Atirei nela na raiva”, afirmou.

 

A estudante de direito foi morta com dois disparos, que também acertaram a cabeça dela. Os corpos de mãe e filho foram encontrados pela irmã de Ariele, que retornava da escola.

 

O pivô da discussão, segundo o acusado, foi o encontro dele com o pai de Ariele. Ele disse que procurou o sargento para saber qual era a intenção dele, por conta das supostas ameaças. O encontro teria deixado Ariele nervosa. Porém, o Ministério Público contesta esta versão do depoimento. De acordo com o órgão, o encontro entre o acusado e o pai de Ariele ocorreu horas depois do crime. Na ocasião, Jeanderson teria dado, inclusive, ao pai da ex-namorada o dinheiro que levava para comprar o remédio do filho.

 

Após cometer o duplo homicídio, o rapaz disse que jogou o celular de Ariele na frente da casa dela. O aparelho nunca foi encontrado. Na fuga, procurou uma oficina para trocar um dos pneus da moto, que estava furado. No local, o acusado escondeu a pistola embaixo de uma pilha de madeira. Após ter se entregado à polícia, Jeanderson indicou o local em que estava a arma, que foi apreendida. O acusado ainda trocou de roupa em casa, fez uma cobrança e, em seguida, se encontrou com a namorada antes do duplo homicídio ser descoberto.

 

O acusado afirmou na audiência que ficou sabendo da morte do filho quando conversou com o pai dele por telefone. “Eu sabia que tinha matado a Ariele, mas meu filho não. Eu não tinha visto o disparo. Só fiquei sabendo quando o meu pai ligou”, acrescentou. O acusado fugiu e, quatro dias depois, se apresentou espontaneamente à polícia.

 

Ao G1, a promotora Lindinalva Rodrigues Dalla Costa revelou que o acusado apresentou uma série de contradições durante o depoimento. A mais grave, segundo a promotora, refere-se ao momento do disparo que culminou com a morte do garoto de quatro anos. “O depoimento do Jeanderson contradiz até mesmo a prova pericial que mostrou que o tiro que acertou o filho dele foi direcionado e não acidental. Até o estrado da cama foi atingido pelo tiro”, apontou.

 

Ainda de acordo com a promotora, o laudo pericial aponta que o disparo contra o garoto teria sido efetuado de cima para baixo, bem próximo ao corpo e não a alguns metros de distância, conforme versão apresentada pelo acusado.

 

Relação conturbada
A relação entre Ariele e Jeanderson foi marcada por desentendimentos. Eles se conheceram ainda adolescentes. Segundo a família da estudante de direito, o rapaz não pagava a pensão do filho. Durante a audiência, Jeanderson negou a acusação e disse que tem, inclusive, recibos dos pagamentos.

 

Ele apontou ainda que a relação com Ariele não perdurou por conta do temperamento da estudante. Jeanderson afirmou que a ex-namorada arrombou a porta da casa dele por duas vezes e danificou uma moto por não aceitar o fim do relacionamento. Mesmo separado, o casal ainda se encontrava meses antes do crime.

 

“Nunca registrei esses fatos à polícia e esse foi meu erro. Antes de apertar o gatilho eu era vítima e agora estou aqui como réu. Estou pagando um preço pela desobediência a meu pai. Ele disse várias vezes que ela era agressiva, estourou duas portas, quebrou a moto”, destacou.

 

Diferente da versão do acusado, a irmã de Jeanderson, informou que Ariele era “divertida, alegre, prestativa e muito inteligente”. Ainda segundo ela, a vítima era “carinhosa” e agia de forma natural com as pessoas. Ela disse ainda que o único vínculo entre o casal era o filho deles. “Não existe motivo nesse mundo para matar ninguém. Até hoje minha família não entende como isso aconteceu”, destacou a irmã do acusado.

 

Em entrevista ao G1, o defensor público, José Carlos Evangelista, que presta defesa ao acusado, afirmou que a meta é reduzir a pena de Jeanderson durante o julgamento. “Vamos trabalhar para isso. Mas eu acredito que o crime pode ser considerado um homicídio simples e essas qualificadoras que estão sendo imputadas a ele não existem”, declarou.

 

O acusado está preso à espera do julgamento no Centro de Ressocialização de Cuiabá (CRC). Ele foi transferido para esta unidade prisional porque foi espancado e ameaçado de morte por detentos da Penitenciária Central do Estado, onde estava anteriormente.