Por um triz. Foi por muito pouco que ele não deixou o Parque São Jorge. Era fim de 2011, e ele ainda vivia a ressaca do título Brasileiro.
Em férias nos EUA, Tite ficou irritado com as notícias sobre a pedida de seu agente, Gilmar Veloz, para renovar o contrato com o clube.
Daniel Garcia - 27.jun.12/France Presse | ||
Tite orienta os jogadores do Corinthians |
À época, Andres Sanchez, então presidente, falou publicamente que Veloz pedia R$ 700 mil mensais. O cartola considerava um absurdo dar um aumento de cerca de R$ 250 mil ao técnico.
Tite só soube do problema quando seu nome começava a ser chamuscado publicamente. Àquela altura, o técnico campeão brasileiro se tornava o técnico mercenário. Um pesadelo para Tite.
Pensou se valeria a pena continuar com essa fama. Mas respirou e ligou para Andres. "Paga o quanto você achar que tem que pagar e fala com o Gilmar. Está tudo certo", disse. Foi a senha para o contrato ser fechado, abaixo de R$ 600 mil.
Assim, evitou se despedir do Corinthians como fizera em 2005, quando saiu brigado com Kia Joorabichian.
Mais: impediu que uma história que culminaria no inédito título corintiano na Libertadores fosse abortada.
O INÍCIO
Favorito ao Brasileiro-2010, o Corinthians via o título escapar lentamente. O técnico Adilson Batista foi demitido.
O nome de Tite, que treinava o Al Wahda, dos Emirados Árabes Unidos, foi o primeiro levantado. Ele já havia sido sondado por diretores quando Mano Menezes saíra.
Longe da família, Tite estava insatisfeito. A mulher, Rose, e os filhos o visitavam esporadicamente. Foi o suficiente para ele aceitar a proposta espinhosa de assumir a equipe naquele momento.
A missão era levar o time ao menos à Libertadores, sendo que só restavam oito jogos.
Tite conseguiu seis vitórias e dois empates. Não ganhou o título, mas garantiu a vaga na Libertadores. Ano novo, jogadores mais acostumados com seu trabalho, ambiente mais leve.
Por pouco tempo.
A eliminação na Libertadores ante o Tolima poderia ser o estopim para sua demissão. Tite não tinha a simpatia do público. Era burocrático em entrevistas, respondia com termos técnicos não digeridos por torcedores e cartolas.
Normalmente, a soma de um fracasso enorme com a pouca aceitação do público significaria demissão.
"Imagina a joia rara que teríamos perdido se tivéssemos demitido o Tite àquela época", lembra Mário Gobbi, diretor de futebol em 2011 e atual presidente corintiano.
O técnico foi mantido. O próximo jogo seria contra o Palmeiras. Uma derrota seria a gota d'água para a queda. Mas a vitória de 1 a 0 amenizou a crise instalada no time.
Daí em diante, a aproximação do treinador com a torcida só cresceu. Luciano Signorini, seu assessor de imprensa, ligou para Tite, que iniciou um tipo de treinamento para lidar com a mídia.
A figura séria e truncada de Tite começava a se desfazer. Ao mesmo tempo, surgia um homem brincalhão e folclórico, conhecido por amigos, familiares e até mesmo atletas.
Encarnou a "Titebilidade".
Em entrevistas, começou a aceitar brincadeiras que faziam por ele usar termos como "treinabilidade".
E, com atitudes tomadas perante o elenco corintiano, deu corpo a essa imagem.
No Brasileiro-2011, Tite sacou do time seu líder e capitão. Ao perceber que Chicão não estava bem, substituiu-o pelo reserva Paulo André.
Cartolas garantiam que Tite perdia naquele momento o controle da equipe. Isso de fato aconteceria se o treinador não costurasse a troca.
Antes de tirar Chicão, Tite o chamou para uma conversa e explicou o motivo da troca. Na língua dos boleiros, costuma-se dizer que essa atitude o fez ganhar o zagueiro --e não perder o elenco. Chicão ainda voltou a ser titular no fim do Brasileiro e levantou a taça do campeonato.
Mais tarde, Tite teria que fazer o mesmo em três posições. Com Liedson, Júlio César e outro capitão: Alessandro. A costura foi a mesma, e o resultado, igual. "Ser justo é difícil", dizia ao ir à final.
Willian e Élton, atacantes costumeiramente acionados pelo técnico, foram à Argentina, mas ficaram de fora do jogo contra o Boca. Romarinho, de 21 anos, começou no banco. Deu no que deu.
Tite mostrou que seu time não tem estrelas, não tem capitão fixo. Mas foi o homem que colocou todos esses nomes, inclusive o dele, na história do Corinthians como os primeiros vencedores da Libertadores da América.